A CABALÁ DE EXU: VIRTUDES REQUERIDAS AO SACERDÓCIO
Por Táta Nganga Kamuxinzela
@tatakamuxinzela | @covadecipriano | @quimbandanago
Quimbanda é tradição;
por outro lado, tradição é transmissão. Isso significa que se você não recebeu
de um mais velho o fundamento, dentro da relação iniciática estabelecida com
seu feitor e mestre de Quimbanda, então você não tem nada efetivamente. Isso é
tradição!
A vida é algo muito
importante na Quimbanda, como uma herança do culto banto. A vida é a
encruzilhada onde os mortos podem cruzar a linha da morte e retornar à experiência
da vida. É através dos vivos, oS médiuns kimbandas, que Exu e Pombagira
podem vir em terra trabalhar. É da força vital (moyò | àṣẹ) dos
vivos que depende o trabalho dos Mestres Exus e Pombagiras em terra. Quando um táta-nganga
transmite o àṣẹ da Quimbanda no curso da iniciação, esses dois fatores,
morte e vida (o Exu e o kimbanda), trabalham uníssonos na transmissão.
Na falta de um desses fatores fundamentais, não há transmissão na tradição de
Quimbanda.
A Cabalá de Exu
é um oráculo da Quimbanda Nàgô, transmitido dentro de uma linha iniciática de
autorização e autoridade espiritual. No curso de sua jornada de iniciação o kimbanda
recebe de seu táta-nganga a autorização para trabalhar em nome do
Povo de Ganga atendendo pessoas: é quando ele recebe a Faca de serviço e o
oráculo. Imbuído de autoridade espiritual ele torna-se um sacerdote de
Quimbanda a trabalho/serviço do Povo de Ganga.
Receber as Cabalá de
Exu é uma honraria dentro da tradição de Quimbanda Nàgô, quando o kimbanda
torna-se autorizado em nome do Povo de Ganga para prestar serviços sacerdotais na
Quimbanda Nàgô.
Passos ou virtudes
importantes a serem desenvolvidas por um kimbanda que inicia seu
sacerdócio como oraculista na Quimbanda Nàgô:
1. Honre
seus mais velhos e a autoridade espiritual de seu táta-nganga.
2. A
verdade acima de qualquer coisa.
3. Sabedoria.
4. Confidencialidade.
5. Integridade
espiritual.
6. Objetividade.
7. Tato.
8. Responsabilidade.
9. Autoconhecimento.
Honre seus mais velhos e a autoridade espiritual de seu táta-nganga.
Dentro dos princípios
da tradição, você deve receber de seu táta-nganga a autoridade e
autorização espiritual para prestar serviços sacerdotais em nome da Quimbanda
Nàgô com seu oráculo. Oracular na Quimbanda Nàgô exige técnica, mas o kimbanda
deve ir além da técnica, sua percepção e envergadura espiritual devem adentrar
meandros em que a técnica não consegue penetrar, e isso só é possível quando se
recebe a autoridade e autorização espiritual de seu táta-nganga para o
sacerdócio oracular de Quimbanda. O conhecimento ou fundamento da técnica é
transmitido através de ensinamentos pelo táta-nganga, mas é a
autorização dele que lhe outorga, dentro dos limites da tradição, a condição
espiritual necessária para empreender o trabalho sacerdotal.
A verdade acima de qualquer coisa.
Não manipule o oráculo.
O espírito da mentira corta/impede o àṣẹ do oráculo. Quanto mais você
manipula e mente em nome do oráculo menos acesso ao campo de destino dos
consulentes você terá. Isso comprometerá completamente seu trabalho sacerdotal
na Quimbanda Nàgô e logo você será cobrado pelo Povo de Ganga.
Sabedoria.
Quando um adepto inicia seu trabalho sacerdotal na
Quimbanda Nàgô prestando serviços de adivinhação, é importante que ele vá além
do conhecimento da técnica. O kimbanda constantemente pratica rezas e
invocações aos Maiorais sobre o seu oráculo solicitando a sabedoria requerida
para auxiliar os consulentes que chegam com suas demandas, porque é a sabedoria
o prumo ou medida entre a natureza do que Exu mostra e a
natureza do ego que interpreta. Ter o conhecimento da técnica não é
necessariamente ter sabedoria. Um kimbanda sem sabedoria certamente
destruirá não apenas ele próprio, mas também seus consulentes.
Confidencialidade.
Uma preocupação fundamental do kimbanda oraculista
é a manutenção da confidencialidade de um consulente. Ao receber a Cabalá
de Exu o kimbanda presta alguns juramentos. Um desses juramentos
é manter sigilo total sobre tudo o que envolve os casos dos consulentes. O
consulente que chega deposita toda a sua confiança no sacerdote que o atende;
o kimbanda deve respeitar/honrar esse respeito, aprovação e confiança
recebidos, porque de todas as virtudes que ele possui como oraculista da
Quimbanda Nàgô, a confiança de seus consulentes é seu bem maior. Nesse
processo, o kimbanda zela para que seu consulente possa lhe entregar
de coração e possa se sentir a vontade para falar profundamente sobre suas
questões mais íntimas.
Integridade espiritual.
Um kimbanda nunca deve utilizar as informações
de um consulente para obter algum tipo de poder sobre ele. Isso é desonroso:
apenas gente fraca e oportunista faz isso! O dinheiro que o consulente paga
entra na vida de um kimbanda oraculista na forma de àṣẹ. Esse
tipo de atitude manipuladora contamina o àṣẹ que chega, porque ela
distorce a confiança que o consulente tem no sacerdote que o atende.
Integridade espiritual no oráculo é oferecer ao consulente a mesma intenção, em
igual medida, que ele tem em relação a sua iniciação. Se a sua intenção é
manipular o consulente que chega, então o oráculo irá lhe enganar; Exu vai
brincar com seu sacerdócio! A intenção do kimbanda em relação ao
oráculo e seus consulentes espelha a intenção que ele mesmo tem para com a sua
iniciação. Quem tem integridade genuína e espiritual recebe honrarias de Exu e Pombagira
no Reinado do Chefe Império Maioral, o Diabo.
Objetividade.
Kimbandas oraculistas devem desenvolver a capacidade
de separar a interpretação da adivinhação. Ignorar o que é visto durante o
oráculo com base nos desejos dos consulentes ou nos dele próprio não é apenas
ruim, mas pode trazer consequências irreversíveis a jornada da iniciação. Seja
objetivo, tenha tato e responsabilidade ao oracular em nome da Quimbanda Nàgô,
porque manipular o oráculo traz má sorte ao caminho e desenvolvimento espiritual
na tradição. O que sair no oráculo como resposta deve ser dito da melhor forma
possível; se a notícia é ruim e traz mal agouro, o kimbanda sempre é
otimista em transmitir a mensagem, porque o otimismo carrega sentimentos de
vitória, mesmo que futura, no íntimo de seus consulentes. Não desespere e
angustie mais o Orí de quem o procura para obter soluções. Diga a
verdade, com tato e responsabilidade!
Tato.
Como oraculistas, nós kimbandas
somos mensageiros do divino. Através de nossas palavras nós transmitimos as
mensagens que chegam dos espíritos. Consegue entender a responsabilidade e o
peso de ser um oraculista da Quimbanda Nàgô? Quando nós transmitimos as
respostas do oráculo, sejam positivas ou negativas, falamos diretamente com o Orí
de nossos consulentes. Nossas palavras para eles têm peso e autoridade
espiritual. Portanto precisamos ter tato para entregar as mensagens que
recebemos para não causarmos danos profundos nos consulentes.
Responsabilidade.
Os consulentes que
chegam sempre trazem demandas diversas. É preciso desenvolver uma
responsabilidade profunda ao lidar com algumas questões, como o sexo de um bebê
que está para nascer. De nossa resposta uma vida será planejada. Tenha responsabilidade
ao tratar do destino das pessoas, porque o destino de cada um é a joia de sua
passagem pela matéria, é a conquista do destino que conclui a nossa obra na
legião dos vivos.
Autoconhecimento.
O sacerdócio não é
brincadeira! Nós lidamos com o destino das pessoas que nos procuram, suas vidas
e seus problemas. E quando os consulentes nos procuram e aceitamos ajudá-los,
assumimos para nós parte do problema que chega. Vele a pena? Antes de se
voluntariar ao sacerdócio, saiba profundamente o que te motiva: é o seu destino
ou é o seu ego? Como um kimbanda oraculista você trabalhará muito e sentirá
na pele o peso do ordálio de assumir para si os problemas das pessoas. Conhecer
a si mesmo, suas capacidade e sua envergadura espiritual, é um requerimento
fundamental ao sacerdócio.