QUIMBANDA: SISTEMA MÁGICO OU RELIGIÃO

Neste texto, que é um excerto do seu livro «Quimbanda Nàgô: O Culto de Exu e Pombagira Revelado», Táta Kilumbu apresenta a Quimbanda tanto como uma Religião quanto um Sistema Mágico que pode ser agregado a qualquer tipo de prática...


Por Táta Nganga Kilumbu

@quimbandamarabo
| @tatakilumbu
 

 

Nota: o presente texto é
um excerto do primeiro volume do livro «Quimbanda Nàgô: O Culto de Exu e Pombagira Revelado», de
autoria de Táta Kilumbu, a ser lançado em breve
.

 

Quando falamos
«Quimbanda» no decorrer desta obra estaremos nos referindo ao Culto de Exu e
Pombagira formado em «Terras Brasileiras» por meio de um longo processo de
sincretismo religioso e cultural, que vem a ser uma adaptação e corruptela da
palavra «Kimbanda» oriunda do dialeto kikongo, um dos dialetos dos povos banto.
Assim, toda vez que usarmos o termo «Kimbanda» estaremos nos referindo à sua
expressão cultural africana, que significa «o sacerdote curandeiro» de forma
bem resumida, mas que será explicado melhor em capítulo posterior.
 

Deixando claro que
adotaremos tais termos apenas para evitar confusões, tendo em consideração que
iremos abordar ambos termos e etimologias. Entretanto, utilizar o termo
«Kimbanda» para se referir ao Culto Religoso ou Sistema Mágico dos Exus está
afirmativamente correta, apenas é uma forma de escrever de origem do dialeto
banto. Logo, o termo «Quimbanda» é a forma da língua portuguesa «brasileira»
expressar o termo banto «Kimbanda».
 

A Quimbanda foi tão
difundida, pela presença do culto de Exu e Pombagira, que foi se infiltrando e
adentrando diversos cultos em nosso país, como a Jurema, Catimbó, Canjerê,
Umbanda e Candomblés. Esta forma de culto de Exus muitas vezes são formas
veladas de Quimbanda, e nestes casos, formam o paralelo oposto com a prática
que atuam, sendo assim, estas Quimbandas uma forma religiosa de prática, logo,
um culto religioso, o qual está totalmente imerso no seu sistema dominante,
sendo nomeada atualmente por alguns como «Quimbanda Independente», o qual tem
seu encabeçamento de nomenclatura o Mago Luberoth, da Quimbanda Xambá; e este
termo foi realmente bem delimitante e marcante para o culto dos Exus.

Assim, os religiosos
que professam essa forma de culto concebem a formação das forças opostas como
elementos provindos de uma mesma regência, ou seja, «Deus e o Diabo» são partes
do mesmo corpo e os Exus e Pombagiras estão vinculados ao processo evolutivo
ascendente. A plenitude caótica de Exu é afetada pelos momentos convergentes e
sob hipótese alguma existe o comprometimento ao embate interno consciente, da
elevação luciférica da alma humana.
 

Por outro lado, existe
a Quimbanda que é vista como um «Sistema Mágico». Os praticantes desse tipo de
Quimbanda entendem-na como um método para alcançar seus objetivos. Não se trata
de uma forma de elevação religiosa de culto, é apenas uma ferramenta mágica para
obtenção de resultados, bem similar a quase todos os sistemas de Magia
Cerimonial Evocatórias. Nesta forma, teremos uma forte fonte de obtenção de
Gnose, afinal, por ser parte de exprimir a realidade de seus Egos, com a
prática deste Sistema Mágico, o homem aprende e compreende a natureza das
coisas, sendo inundado pela Gnose Luciferiana, pelo conhecimento sagrado do ser
e da natureza. Basta analisar e veremos grandes sacerdotes de diversos cultos
que tem um regramento e uma vida diferenciados por também pertencerem a este
círculo de magia, que faz com que ele cresça a ponto de se tornar uno com a
Fonte Máxima Maioral.
 

Existe ainda uma
terceira corrente, apoiada pela LTJ 49, que vem a expressar uma ideia de
«Quimbanda Gnóstica». Esta linha de pensamento surge a partir do momento que os
mesmos não compreenderem o fato de obtenção de Gnose pela via de Sistema
Mágico. Assim, os praticantes e seguidores dela encaram a Quimbanda como uma
religião única que não aceita prática religiosa alguma que não tenha suas bases
dentro de seu sistema, opondo-se as formas diversas de contatos com os Deuses
de diversas culturas. Nós, em nossa corrente não temos este ideal, Quimbanda
para nós é um Sistema Mágico e Espiritual com pontes e vórtices de obtenção de
Gnose e auto-elevação da Alma Humana ao Estado de Deuses, em outras palavras, o
processo de despertar e deificação da alma. Todavia, quando desta tradição, a
LTJ 49 fala sobre sua «Quimbanda Gnóstica», o mesmo o faz exaltando a sua
vertente como a verdadeira criada pelo Maioral, deslocando as vertentes
tradicionais para uma posição de «fracassadas» ao dissertar sobre serem apenas
uma farsa controlada pelo «Falso-Deus», mesmo falando da figura de Lúcifer e
outros Diabos, segundo seu discurso, veremos isso no livro O Culto da Chama
Vermelha e Preta
e na página da web, da corrente em epígrafe que nos deixa
claro sua visão quanto as demais vertentes:
 

Entendemos
que durante muitos anos a Quimbanda foi desenvolvida dentro de ambientes
maculados, exotéricos, infundamentados e estagnados onde as pessoas sorviam a
seiva amaldiçoada que escorre pelas raízes da «Árvore da Vida» enquanto
estigmatizavam seu nome. Em diversos locais a prática se tornou um verdadeiro
«teatro» movido pelo Ego de seus praticantes limítrofes que usavam as «máscaras
de Exu» para ocultarem sua sensibilidade à rejeição e aos sentimentos de
insegurança quanto à autoidentidade. Lamentavelmente, muitos
«terreiros/templos/casas» ainda vivem atrelados aos transtornos paranóicos,
porém, V.S. Maioral eclodiu sua «primium-bivio itineris» e expandiu a Quimbanda
para dentro dos círculos esotéricos sérios e dispostos a entrar em guerra
contra a inércia e a sandice que norteia o Culto de Exu. Sabemos que em nome da
estabilidade de suas mentiras alguns indivíduos insistem em proteger a forma de
suas pedras cúbicas, mas a Verdadeira Quimbanda sempre estará disposta a rachar
essa pedra e dividir seus fragmentos entre as Almas Ígneas. […] Quando
iniciamos o projeto da Quimbanda Brasileira e construímos o T.Q.M.B.E.P.N.
fizemos de forma consciente, pois víamos claramente certas rachaduras dentro do
Culto que possibilitavam a infiltração gerando transformações nas formas de
pensamentos e ação. […] A verdadeira essência necrosófica da Quimbanda foi
guardada durante anos por aqueles que conseguiram um despertar interno intenso
e o suficiente para escapar das emanações profundas do «Falso-Deus». (…)
Entendemos que transcrever a diferença entre os homens é um ponto importante
para elucidar o verdadeiro espírito Quimbandeiro e para isso apelamos ao
Conhecimento do Satanismo Anticósmico.

 

Certamente
o Senhor do Artoche nos forneceu luz para que pudéssemos discernir o real do
fictício e nos tornássemos opositores das mentiras. Acreditamos que a
verdadeira Quimbanda é Luciferiana, mas esse ponto deixamos os adeptos e demais
leitores decidirem. […] De tal forma, não podemos limitar Maioral apenas a
Lúcifer, Beelzebuth e Astaroth como fazem os profanos.

 

Diante dos fragmentos
em epígrafe retirados dos materiais didáticos da tradição de Quimbanda
Luciferiana, também chamada por seu fundador de «Quimbanda Brasileira».
[1]
Mas aqui vemos claramente que a visão dessa corrente que apenas em meados de
2010 é que a verdadeira Quimbanda de manifesta no mundo, sendo fruto de
práticas e conhecimentos dos círculos fechados do Satanismo Anticósmico, e não
como uma manifestação fidedigna da tradição religiosa afro-brasileira, apesar
de se valer de fundamentos ritualísticos e litúrgicos derivados da Quimbanda
Nàgô e da Quimbanda das Almas, não se trata de uma real ramificação da mesma,
tendo em consideração sua origem «esotérica». Tal fato é tão agraciado, que
alegam que as versões tradicionais estariam no «engano» do «Falso-Deus», termo
o qual cunharam para o Demiurgo, assumindo a total soberania na Criação por
parte do Deus Cristão, de forma indireta, fato observado pelo desdenho no
entendimento trinitário dos Maiorais da Quimbanda. Em realidade vemos um culto
afro-brasileiro dando uma importância extrema ao Jeová (YHWH) em contrapartida à
Nzambi, a qualquer outro conceito e entendimento «pagão» de Deidades, se
tornando, em nosso ponto de vista, uma espécie de «cristão invertido» propagado
principalmente pelo uso dos crucifixos invertidos.
 

A Quimbanda Nàgô é uma
manifestação religiosa desbravadora, libertária e totalmente independente, ou
seja, se enquadrando perfeitamente dentro do «quadro» das vertentes de
Quimbanda Independentes e Tradicionais, não sendo mero nome ou facção de culto
que complementa outro, sendo sim, a totalidade de um Culto Religioso e Mágico,
o qual podemos nomear dentro das versões das nomeadas «Quimbandas
Tradicionais». Sendo assim, os Exus e Pombagiras não são «guardiões espirituais
à esquerda» de ninguém, dentro de nosso conceito, pois se estão no todo, suas
forças estão intimamente ligadas aos conceitos de «direita e esquerda», de bom
e mal, de luz e trevas, sendo Exu e Pombagira, o caminho da Quimbanda Nàgô, um
caminho completo, real e verdadeiro, que assume toda a luminosidade de um
conceito, assim como seu lado obscuro e sinistro de evolução. Neste ponto,
apesar de discordarem, entra o lado real que todos os Exus, segundo nosso
entendimento, são seres caóticos, desagregadores, cósmicos, em analogia aos Eudaimones
e Kakodaimones gregos. De modo semelhante à um Ndoki (feiticeiro kikongo)
e a um Muloji (feiticeiro kimbundu), o feiticeiro Kimbanda
(curandeiro banto), é a reunião dos poderes dos espíritos, da natureza e dos
mortos, o qual domina toda a sua essência, sem julgamentos baseados em falsos
escrúpulos da moralidade maniqueísta presente nas religiões de mão direita,
principalmente do Cristianismo e do Kardecismo, principais destruidores e
deturpadores dos conceitos africanos espirituais e morais presente em nos
cultos afro-brasileiros.
 

Dessa forma, quando
falamos que é um sistema Mágico e Religioso, é devida a sua grande maneira
amorfa de ser, podendo ser adequar dentro das práticas de um sacerdote ou
sacerdotisa de qualquer culto, ou mesmo de um adepto, como um «Sistema Mágico»,
ou seja, um processo mágico de feitiçaria, em que os espíritos são chamados,
através de evocações e oferendas diversas, para atuarem sobre fins específicos.
Nestes casos normalmente os praticantes desse método não se importam com as
questões cosmogônicas, o importante é o resultado. Já quando falamos de
«Sistema Religioso» é sinônimo de «Religião», ou seja, é aquele que enxerga em
seus ancestrais divinizados Exus e Pombagiras toda a sua essência, toda a força
para sua vida material e espiritual. Assim as Entidades passam a ocupar as
posições de Deuses e Deusas que irão atuar sobre toda a vida do adepto.
Portanto, é quando a Quimbanda, independente de vertente, passa a ser a
totalidade na vida do indivíduo, suprindo todas as suas necessidades. E assim,
este processo é um dos pontos importantes da Quimbanda e suas vertentes, o qual
irá se adaptar profundamente com o ideal de vida e os conceitos que cada ser
humano traz, não sendo impositiva, porém, sedutora.

Sendo assim, a
Quimbanda é um Sistema Mágico e uma Religião, dependendo apenas do adepto e de
sua colocação perante o culto tradicional aos Exus e Pombagiras, pois ela
prestará na resolução de suas causas de igual modo. Apesar que é facilmente
encarada como religião e praticada como sendo por praticantes de religiões mais
primitivas, que conseguem enxergar a complexidade dos planos espirituais. Como
é um culto libertário, suas práticas conseguem se adaptar perfeitamente ao modo
de vida e às práticas do adepto, podendo apenas ser um acréscimo de ferramentas
mágicos-litúrgicas, sendo então considerada um sistema mágico, ou também
podendo ser uma forma de conexão com as forças dos seus antepassados e seres da
natureza, sendo então uma forma religiosa, que nesta forma também irá acarretar
no quesito «gnose», ou seja, na produção de conhecimento libertador e natural
dos seres humanos em seu processo de deificação da alma, mais conhecido no
orfismo grego e no luciferianismo moderno como «apotheose».



[1] Termo este que não achamos
convencional, devido ao fato de que é um termo genérico para todas as vertentes
de Quimbanda, afinal, todas são brasileiras natas.